Planejamento Tributário e Propósito Negocial: O Que Está em Jogo nas Operações com Ágio e Empresa-Veículo

Nos últimos anos, o uso de estruturas societárias para fins de planejamento tributário tem sido alvo de atenção crescente por parte das autoridades fiscais e dos tribunais superiores. Um dos temas mais debatidos envolve a amortização do ágio — aquele valor pago a mais na aquisição de participações societárias — especialmente quando há interposição de uma chamada “empresa-veículo”.

Embora o planejamento tributário seja uma prática legítima, ele precisa estar amparado por um propósito negocial real. Ou seja, não basta buscar economia fiscal: é necessário demonstrar que a operação tem fundamentos econômicos e objetivos empresariais concretos.

Divergência nos Tribunais

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem adotado entendimentos distintos sobre o tema:

  • A 1ª Turma, no caso Cremer (REsp 2.026.473/SC), reconheceu que a amortização do ágio é válida mesmo com empresa-veículo, desde que não haja simulação ou artificialidade na operação.
  • Já a 2ª Turma, no REsp 2.152.642/RJ, entendeu que a ausência de substância econômica pode configurar abuso de direito, tornando indevida a dedução do ágio.

No âmbito administrativo, o CARF — Conselho Administrativo de Recursos Fiscais —também tem flexibilizado sua posição em alguns casos. Em 2025, por exemplo, reconheceu o propósito legítimo em operações envolvendo a Notre Dame Intermédica e a Raízen, afastando autuações fiscais ao considerar exigências regulatórias e estrutura econômica real.

O Que Isso Significa na Prática?

Empresas que pretendem realizar operações com geração de ágio devem estar atentas a alguns pontos essenciais:

  • Demonstrar que a empresa-veículo possui atividade operacional ou função estratégica;
  • Apresentar laudos técnicos que justifiquem o ágio com base em expectativas de rentabilidade;
  • Documentar os objetivos econômicos, regulatórios ou societários da operação.

A falta desses elementos pode levar à desconsideração da estrutura e à glosa dos benefícios fiscais.

Conclusão

Diante da instabilidade jurisprudencial, é fundamental que empresas adotem uma postura cautelosa e bem fundamentada ao estruturar operações desse tipo. O acompanhamento por profissionais especializados — jurídicos e contábeis — é essencial para garantir segurança e conformidade.

O escritório BGI Advogados está atento às movimentações dos tribunais e órgãos administrativos, e preparado para orientar seus clientes na construção de estratégias sólidas e defensáveis em matéria tributária.

Por: Jéssica Donato | BGI Advogados | Agosto de 2025